O consenso de mercado é que sim, estamos! Apesar da introdução do esquema SEPA SCT INST, em 2017, os pagamentos instantâneos conta-para-conta (A2A - Account-To-Account) na Europa não tiveram a adesão esperada. Se excluirmos os casos de Espanha e dos países escandinavos - principalmente em pagamentos P2P (Peer-To-Peer) - a taxa de adesão dos pagamentos instantâneos ainda é muito baixa.
No entanto, e com o intuito de mudar este cenário, os reguladores e organismos europeus decidiram implementar requisitos obrigatórios e serviços de valor agregado para promover o crescimento deste tipo de pagamentos. Fizeram-no devido às inúmeras vantagens que oferecem, nomeadamente em termos de velocidade e conveniência, tanto para consumidores como empresas.
A evolução dos pagamentos instantâneos na Europa
Apesar dos números estarem aquém do esperado, a evolução dos pagamentos instantâneos na Europa reflete um assinalável aumento deste tipo de pagamentos em comparação com os formatos não instantâneos (transferências clássicas), tanto em volume quanto em valor. Ainda assim, os dados totais ainda refletem uma preferência pelas soluções mais clássicas. Este facto, não impede que tenhamos assistido, nos últimos cinco anos a uma transformação dos serviços bancários, que continuará, pelo menos, por outros tantos. Algo, muito impulsionado por um conjunto de fatores:
- A introdução da Diretiva de Pagamentos PSD2 acelerou a criação de um mercado único de pagamentos, maior concorrência e inovação, assim como melhor proteção e segurança ao consumidor;
- A experiência omnicanal das entidades financeiras melhorou significativamente, em grande parte pelo sucesso dos pagamentos móveis;
- A oferta de operadores aumentou com os novos NeoBancos, Big Techs, fintechs e PSPs (Payment Service Providers), com plataformas eficientes e com preços muito competitivos, que têm estado a ganhar cada vez mais espaço aos bancos tradicionais, especialmente em pagamentos peer-to-peer;
- A nível tecnológico, o Open Banking, as Plataformas de Pagamentos escaláveis na cloud, a conectividade via APIs e os serviços Banking-as-a-Service e Payments-as-a-Service (BaaS/PaaS) têm permitido esta revolução;
- Além dos pagamentos instantâneos, não apenas na Europa, mas a nível global, o inovador serviço “Request for Payments” nos EUA, as carteiras digitais e as contas virtuais deram uma importante ajuda na instantaneidade e versatilidade dos pagamentos;
- Por último, a multiplicação de novos esquemas (como o SEPA SCT Inst e OCT na Europa, RTP, da The Clearing House ou FedNow, nos EUA, PIX, no Brasil, SPEI, no México, entre mais de 20 outros esquemas de pagamentos instantâneos no mundo) criou uma rede muito ampla e diversificada, embora ainda falte conectividade entre eles.
Os próximos cinco anos serão igualmente marcados por uma série de iniciativas que servirão para dinamizar os serviços transacionais baseados em transferências instantâneas, onde a migração da rede SWIFT para a nova norma de mensagens no formato ISO 20022 - as CBDC’s (Central Bank Digital Currency) ou o próprio Euro Digital - implicarão desafios e oportunidades adicionais.
Requisitos obrigatórios
O novo regulamento das transferências instantâneas, em vigor desde abril de 2024, estabelece uma série de requisitos e prazos obrigatórios para as entidades financeiras, dentro e fora da zona Euro, no sentido de promover o seu uso entre particulares e empresas, e em todos os canais disponíveis (web, app, contact center, agências, etc.):
- A partir de janeiro de 2025, será obrigatória a receção de transferências instantâneas e as comissões aplicáveis não poderão ser superiores às das transferências clássicas. O mecanismo de prevenção de branqueamento de capitais (AML) passará a ser executado, pelo menos, uma vez ao dia, ao invés de ser executado em tempo real antes do envio do pagamento, como é feito atualmente;
- A partir de outubro de 2025, será obrigatória a emissão de transferências instantâneas. Assim, para assegurar um maior controlo na luta contra fraudes, estabeleceu-se um novo serviço europeu de validação do IBAN e do nome do beneficiário, que se aplica antes do envio da transferência pelo ordenante. O Banco de Portugal tornou-se pioneiro ao disponibilizar esse serviço aos bancos portugueses, desde junho passado;
- Para entidades fora da zona do euro, os prazos estendem-se até meados de 2027.
Serviços de valor agregado
No que diz respeito aos serviços adicionais de valor agregado, como o SEPA Request to Pay ou os pagamentos SEPA OCT Inst, importa dizer que vêm complementar e também potenciar o uso das transferências instantâneas. Por um lado, o SEPA Request to Pay, disponível desde junho de 2023, consiste num serviço de débito instantâneo e representa uma revolução no serviço de cobranças, que poderá mesmo chegar a competir ou complementar os débitos diretos. Não se trata de um instrumento de pagamento, mas de um pedido de iniciação de um pagamento conta para conta (A2A) por parte do beneficiário, que está associada a uma transferência instantânea do pagador. Por outro lado, e disponível desde novembro de 2023, o SEPA OCT Inst, que enquadra pagamentos One-Leg-Out, em que uma das contas está fora da zona Euro, abre uma nova oportunidade no negócio de representação de bancos correspondentes. Este novo esquema oferece menores custos e maior rapidez em comparação com o esquema Target2, permitindo processar transferências instantâneas até 100.000 EUR e de forma permanente ao longo de todo o ano. Isto permite às entidades aderentes a captação de novos negócios de bancos e de outros prestadores de serviços de pagamentos, fora da zona do euro, o que se traduz num aumento de receita por comissões de gestão.
Conclusão
Por tudo o que acabei de referir, entendo que estamos a assistir a uma evolução ou até mesmo a uma revolução no ecossistema de pagamentos instantâneos, dadas as iniciativas, regulamentações e desafios de negócio que se avizinham. Assim, é de prever que as entidades que antecipem a adoção destes novos modelos tenham uma importante vantagem competitiva, tanto para servir clientes particulares como empresariais.